
Um dia fui ao médico e na recepção do prédio a recepcionista me disse que teria que refazer meu cadastro, pois eles estavam atualizando o sistema, então precisariam novamente dos meus dados. Como estava sempre por lá me pediram basicamente nome, telefone e RG, dispensando a apresentação do documento.
Pensei: “ufa, enfim vou resolver esse cadastro que sempre me incomodou e eu nunca tinha parado para alterá-lo.”
Relato o que aconteceu:
Meu marido frequentava esse local a mais tempo que eu, de modo que havia o seu cadastro com nosso telefone residencial. Quando eu comecei a ir até lá utilizava seu cadastro para ter acesso ao prédio. Passado algum tempo ele foi espaçando suas idas, então decidi solicitar que mudassem o cadastro para o meu nome, já que eu costumava ir com frequência.
A atendente fez a devida alteração e neste momento me pareceu que estava tudo certo. Quando voltei dias depois, falei o telefone e ao confirmarem o meu nome, o sobrenome que constava em meu cadastro era o do meu marido. Penso que quando pedi para alterá-lo para meu nome, ficou subentendido que o meu sobrenome era o mesmo dele e assim permaneceu. Eu não havia me dado conta do equívoco inicialmente.
Na eterna pressa em que vivemos, ou vivíamos antes da pandemia, cada vez que ia até lá e era confirmado meu nome com aquele sobrenome que NÃO era o meu, pensava: quem é essa pessoa? Mas nunca solicitava a alteração, sempre na correria! Enfim o prédio me fez parar para alterar o cadastro quando ocorreu a mudança do sistema e só assim resgatei meu sobrenome.
Fico imaginando todo trabalho da mulher em alterar seu nome em todos os documentos quando se casa e ter que fazer tudo isso novamente caso venha a se separar. Que canseira!
Já havia pensado algumas vezes sobre essa questão e agora ela retornou: de onde vem essa ideia, essa cultura, da mulher ter que adotar o sobrenome do marido?
Em algum momento da minha vida, na fase romântica perdida nos labirintos da adolescência, sonhava que um dia me casaria e passaria a usar orgulhosamente o sobrenome do eleito pelo meu coração. Quando o eleito foi escolhido não pensei em casamento, muito menos em mudar o meu nome. Essa escolha não tinha a ver com ele, mas sim comigo. Não conseguiria mudar meu nome, uma marca forte da minha identidade. Sentia que se fizesse isso passaria a ser uma propriedade dele e também perderia um pouco de quem eu sou. Talvez seja um exagero, mas ainda penso assim!
Acredito que essa questão não deva ter o mesmo significado para tantas outras pessoas, que podem escolher como se sentem melhor, o que lhes faz ou não sentido, se querem ou não adotar o nome de seus companheiros ou companheiras.
Mas numa sociedade patriarcal, machista, que defende uma moralidade pautada nesse tipo de tradição, onde muitos homens se sentem proprietários das mulheres, com altos índices de violência contra a mulher (física e psicológica) e de Feminicídio (crime praticado contra a mulher pelo fato de ser mulher), penso que essa reflexão é essencial.
Mulheres, vocês acreditam que adotar o sobrenome do marido é um ato de amor? Isso te faz sentir mais íntima dele? Ou faz sentir que você pertence a ele?
Questione-se: Quem sou eu?